Os jogos do Jogo do Bicho

 

O Jogo do Bicho é uma atividade ilícita, mas que tem origem nobre, em dois sentidos. Seu criador, em 1892, foi o barão João Batista de Dummond, fundador do Jardim Zoológico do Rio de Janeiro, como forma de angariar dinheiro para sustentar o empreendimento. Uma atividade nobre, pois, criada e mantida por um nobre.

Ele escolheu 25 bichos (da águia à vaca), pela ordem alfabética, sorteava um por dia e o cobria com um pano. Os visitantes do zoo recebiam um bilhete com um dos bichos impressos e recebiam o prêmio ao final do dia, quando o pano era retirado e o bicho coincidia com o seu.

O que ninguém entende, contudo, é porque esta, que foi pioneira das loterias do Brasil, nunca foi legalizada. Mas aí é que começa o jogo. A então modesta lotérica segue honesta e ingênua como nasceu. Nunca vi fraude no Bicho.
Quem ganha, leva. O problema é que a atividade acoberta um monte de outros crimes muito mais pesados.

É claro que, quem roda o País de cabo a rabo, sabe que o Bicho é uma atividade constante da vida do brasileiro. No Congresso Nacional ou na birosca lá em Tabatinga, no Amazonas, o jeitão é o mesmo. As regras são as mesmas. O que varia um pouco é a premiação: o quanto se paga por cada categoria de jogo por cada Real investido.

Isso, logo de cara, significa dizer que a proposta de acabar com o Jogo do Bicho no Brasil é bobagem. Câmara Cascudo já dizia que esta era uma atividade “invencível” no Brasil. E ainda é.

A maneira de descriminalizar o Bicho é legalizá-lo. E aí e aí é que o bicho pega. Os talvez milhões de apontadores espalhados pelo País estão inseridos nessa atividade cultural, nada têm a ver com outros crimes. Os banqueiros é que são o problema. Sua ação acoberta tráfico de drogas, contrabandos diversos, agiotagem, sequestros, chantagem e por aí afora.

Sem falar na banda corrupta da polícia, que todo dia vai buscar seu premio na banca do bicheiro. O banqueiro Anísio Abrahão David, o Anísio da Beija-Flor, que foi preso nesta quarta-feira, no Rio, por exemplo, estava com um policial civil como seu guarda-costas.

A perseguição pura e simples ao Bicho só faz a atividade crescer, pelo jeitão solidário que o brasileiro tem. E isso reforça a criminália verdadeira. Isso, sem falar que tira o pão de um mais que considerável número de famílias de brasileiros e brasileiras que vivem dessa atividade.

Fica claro, pois, que o caminho é a legalização. Mais do que isto: legalizar, mantendo a mesma estrutura, com os apontadores por todos os cantos. E não adiante dizer que isso seria “informalidade”, porque não é.

As agências lotéricas, por exemplo, responsáveis pela distribuição das loterias, promovem bolões a torto e a direito e a Caixa Econômica, que as organiza e banca, não diz nada. Pela experiência que a Caixa tem, inclusive na sua atividade precípua da habitação popular, não é possível acreditar que o Bicho não caberia no seu rol de loterias.

O debate reaberto agora, justo no Rio, berço do jogo, fica a oportunidade de o País fazer um movimento pela sua legalização. Com certeza, será mais saudável, como lá no comecinho.

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