Sentencismo, a fase superior do denuncismo

O lacerdismo fez história em nosso país ao notabilizar-se pela prática irresponsável de denunciar (denuncismo) todos que estivessem ligados direta ou indiretamente ao governo do presidente Getúlio Vargas. Para isso, contava com o apoio irrestrito da grande mídia da época, com o propósito de desestabilizar a qualquer custo o seu governo. Conseguiu, ao final, que Vargas se suicidasse com um tiro no peito.

Hoje, o denuncismo está muito mais avançado, mais moderno. Digamos que atingiu seu ápice, sua fase superior: o sentencismo. Se antes a tática era só denunciar por denunciar, hoje a oposição faz o papel da polícia e do judiciário. Ontem mesmo (18/10) um denunciante do Ministro do Esporte deixou de prestar depoimento à Polícia Federal para ser ouvido pela oposição ao Governo Dilma. Um asquelminto depõe para um grupo de notáveis tucanos e afins, para que ao final esses senhores possam sentenciar o Ministro Orlando Silva.

Particularmente não sou contra as denúncias. Gosto delas. Penso que, na sociedade atual, as pessoas deveriam usar mais as ferramentas de comunicação para denunciar, aos órgãos competentes, tudo aquilo que avaliar ser delituoso. O problema é a transformação automática da denúncia, antes mesmo de ser devidamente apurada, em uma sentença arbitrária.

E quem são os sentenciadores do Ministro do Esporte, Orlando Silva? São os mesmos que quando estiveram nos governos neoliberais foram incapazes de patrocinar sequer um Campeonato Mundial de Cuspe à Distância. E agora, em pleno Jogos Panamericanos, onde o Brasil aparece abaixo apenas dos Estados Unidos no quadro geral de medalhas, municiam a pauta negativa da grande mídia e insuflam o seu poder inquisitório como se estivessem morrendo de inveja pelo fato de o Brasil estar se tornando, no Governo Dilma, também uma potência olímpica.

Mas volto a repetir que nada tenho contra as denúncias. Oxalá muitos amigos que estimo, tivessem a coragem para delatar as mazelas que persistem em seus locais de trabalho, de estudo, moradia, etc. Convivemos secularmente com a corrupção comezinha, de grande ou pequeno porte, sem que haja a iniciativa de se denunciar aos órgãos competentes. Muitas vezes o silêncio cúmplice impera, por uma série de motivos pessoais; e talvez seja a classe média quem mais tolera omissa a corrupção, com medo de perder seus benefícios e benesses, aquela que se deleita com o apedrejamento público de um político como se fosse o para-raios de suas inquietações burlescas.

Orlando é atacado porque é um patrimônio do povo brasileiro. Sob sua direção, o Ministério do Esporte promove feitos jamais alcançados por alguma nação em tão pouco tempo: em uma década o Brasil terá realizado todas as maiores competições esportivas do planeta, ao mesmo tempo em que prioriza o esporte como fator de inclusão social, legando uma estrutura e uma cultura desportiva extraordinária ao país.

Como admirador do trabalho do Ministro, sou suspeito para fazer sua defesa. Lembro-me, com muita gratidão, quando Orlando, presidente da UNE, pegou 14 horas de viagem num “Salutaris” de São Paulo à Viçosa (interior de Minas), para prestigiar uma “simples” reunião de formação de chapa para o Diretório Central dos Estudantes (UFV), no final de 1995, mesmo sabendo que iríamos perder, pelas debilidades estruturais enfrentadas na época. Animado com sua presença, aceitei ser candidato à Coordenação Geral. Perdemos, com a chapa “Pra Balançar as Estruturas” por uma diferença de 500 votos, mas Orlando voltou à Universidade Federal de Viçosa para nos parabenizar (e dormir mais uma vez em um colchão emprestado em uma república estudantil), pois a partir daquele momento estava formado o embrião que iria vencer nos próximos anos e ajudar a resistir ao desmonte da universidade pública patrocinado por Paulo Renato e FHC. Dito e feito.

E é justamente por sua histórica atuação política combativa e empenhada, porta-voz de uma plataforma esportiva das mais avançadas, que Orlando atrai a fúria da grande mídia. Essa grande imprensa fará um enorme favor ao Brasil se denunciar as irregularidades existentes em todos os governos, mas se prestará a um grande desserviço se continuar acusando sem provas, aproveitando-se de bandidos que nada têm a perder, para tão-somente atingir seus inimigos de classe.

Cada cabeça uma sentença? Não! Vivemos em um Estado Democrático de Direito, alicerçado por sólidas instituições públicas, e o sentencismo deve ser combatido por todos os amantes da democracia, a fim de se impedir que cada um julgue segundo suas conveniências e interesses mesquinhos, fazendo regredir a Pátria aos seus inglórios dias de lacerdismo.

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