A magia de "passarinhar" com Clarinha na Cidade Jardim

 As crianças se encantam com os sons dos passarinhos

"Todos estes que aí estão/ Atravancando o meu caminho, / Eles passarão…/ Eu passarinho!" (Mário Quintana).

Um dos encantos de andar por algumas ruas do meu bairro é ouvir "passarim"… Os melhores lugares de "passarinhar" na Cidade Jardim são a rua Bernardo Mascarenhas e a praça Professor Godoy Betônico, que virou "praça dos Porcos", por causa das esculturas de uma porca com quatro porquinhos, um deles mamando. Sim, é a praça ao lado da antiga Faculdade de Odontologia, da igreja Santo Inácio de Loyola, coladinha no museu Abílio Barreto!

Não há o que pague o gorjeio de pássaros livres numa metrópole. Já convivi com pássaros presos. Um desastre. O dono viajou às pressas e deixou a gaiola no jardim… Ninguém cuidou do curió. Diga-se de passagem, um serviço que nunca fiz. Sou contra cativeiros… Pense num "barraco"! O tempo fechou. O "bichim" morreu… Vingativo, esperou o dono… Quando perguntou por que o curió não estava cantando e correu pra gaiola, ele agonizava e deu os últimos suspiros na frente do dono! Desde então, gaiolas em minha casa nunca mais!

Sou passarinheira desde criança. "Passarinhar" ou observar pássaros (em inglês birdwatching) hoje é um hobby e uma atividade turística em crescimento exponencial, que difere do que se conhecia no Brasil como "passarinhar": o mesmo que pegar ou matar passarinho. Uma das coisas que mais invejava dos meus irmãos era que eles podiam se embrenhar pelos matos com baladeiras (estilingue) e bodoques pra "passarinhar".

Menina, eu só podia armar arapuca pra pegar rolinhas. Ficava "botando sentido" até a rolinha cair nela… Eram tantas, mas tantas que, numa tarde, com apenas uma arapuca, era possível pegar uma dúzia, cujo destino era a panela. Comíamos rolinhas fritas, como hoje se come codorna. Têm o mesmíssimo sabor. Talvez não armem arapucas nem comam mais rolinha a alho e óleo no sertão onde nasci.

Os tempos mudaram e, mesmo no sertão, sabe-se que é proibido "passarinhar" nos moldes antigos – a fauna silvestre é tutelada pela Constituição e conta com o amparo da Lei nº 5.197/67, que proíbe a utilização, perseguição, destruição, caça ou apanha desses animais, proteção extensiva aos seus ninhos, abrigos e criadouros naturais. "É crime matar, perseguir, caçar, apanhar, utilizar espécimes da fauna silvestre, nativas ou em rota migratória, sem a devida licença ou autorização, nos termos da Lei nº 9.605/98".

Um dos encantos de viver onde se ouvem passarinhos é também ensinar às crianças a apreciação do belo, privilégio que tive com meus netos Lucas e Luana e, recentemente, pude fazer com a neta Maria Clara. É incrível como desde bem pequenas as crianças se encantam, magicamente, com os sons dos passarinhos.

Clarinha (1 ano e 9 meses) aponta pras árvores e diz "Bobó, peu-peu!" (Tradução: Vovó, piu-piu!). E, se falo, ela arregala os olhos, põe o dedinho na boca e diz "xiiiiiiiiii". Ela já sabe que precisa fazer silêncio para ouvi-los. E, se pousam na pracinha, ela ergue a mãozinha pedindo um tempo e sai "devagarinho" atrás deles; e quando voam, ela os imita com os bracinhos, como se estivesse voando, e no seu palavreado diz que voou! E ri gostosamente.

Deitadas após o almoço, ouvimos uma sinfonia e Clarinha, que já apurou o ouvido, detecta imediatamente que é "passarim"… Pede silêncio: põe o dedinho na boca e murmura: "xiiiiiiiiii"… E dorme embalada pelo chilrear dos nossos passarinhos…

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