Uma toca de onde não deve sair coelho
É o que parece, pelo andar da carruagem no Congresso Nacional: a reforma política não estará no centro da pauta do atual semestre parlamentar. E, desse modo, ficará mais uma vez postergada.
Publicado 03/08/2011 13:48
Bom ou ruim? Depende do ângulo da análise. Se for para fazer algum remendo na atual legislação eleitoral prenhe de imperfeições, o resultado em si será muito duvidoso. Nem sempre os remendos têm sido benéficos para o processo democrático. Mas se for para ampliar a democracia, sinceramente: cá da província, olhando a correlação de forças no Senado e na Câmara, ouso dizer que será melhor ficar do jeito que está.
Lembra aquela historinha que Miguel Arraes contava. O sujeito cometera algum delito e, preso, era conduzido por um soldado da Polícia Militar para a Delegacia, que de vez em quando lhe dava uma lapada com o cassetete. Até que um transeunte, indignado, protestou: “Faça isso com o homem não, soldado! Desse jeito é melhor matar…”. Ao que o prisioneiro de pronto atalhou: “Matar, não, oxente! Como vai, vai bem…”.
Vejam que o cotidiano da cena política tem oferecido inúmeros motes para o bom debate da reforma e, sobretudo, para valorizar a instituição de instrumentos democratizantes. O financiamento público de campanha, por exemplo, como antídoto à corrupção. Mas partidos e lideranças influentes no Congresso fazem de conta que uma coisa nada tem a ver com a outra e se perdem na abordagem de aspectos relevantes, porém secundários, como a ideia do voto distrital e semelhantes. Ou, pior, a investida contra o direito democrático dos partidos se coligarem para a disputa de cargos legislativos.
Por esse caminho não se chegará a lugar nenhum. Até porque quase ninguém quer seguir adiante, porque pesa o receio dos atuais detentores de mandato de não se darem bem em futuras disputas sob novas regras. Entre o desconhecido que gera insegurança e o status quo ultrapassado, a opção é clara: conserve-se o que está, e se deixe para um futuro indefinido qualquer mudança substancial.
Esse é o estado da arte da reforma política. Talvez mudasse se o assunto fosse, de fato, destaque na agenda da sociedade. Mas alguém sabe de algum lugar onde na última campanha eleitoral a reforma tenha sido registrada entre os compromissos da maioria dos partidos e candidatos?
Ora, se o que é prometido nem sempre é cumprido, que dirá do que sequer foi ventilado nos palanques. Por conseguinte, o debate permanece quase que exclusivamente circunscrito ao parlamento, sem a menor possibilidade de pressão social pela mudança.
Portanto, dessa toca por enquanto não deve sair coelho. Fica para adiante, na medida em que sejamos capazes de ganhar apoio popular para a bandeira da democratização do processo eleitoral brasileiro.