O direito à moradia e a reforma urbana

O direito de todos à cidade saudável, consagrado na Constituição de 2008 e definido de modo preciso no Estatuto da Cidade, tal como outros direitos fundamentais do cidadão tem sua aplicabilidade esgarçada pelas condições concretas em que a ocupação e uso do território se dá, sobretudo nas metrópoles.

Recente reportagem da Folha de S. Paulo dá conta de que a ocupação de áreas centrais ou de novas centralidades por empreendimentos imobiliários torna a capital "ilhada" por favelas, que são empurradas para áreas fronteiriças ou delas se aproximam, acompanhando igual fenômeno em cidades circunvizinhas.

Isso leva a que – segundo pesquisa da Fundação Seade para a Secretaria de Estado da Habitação – embora detenha 57% da população da metrópole, a capital tem menos favelas (1.594) que o entorno (1.746).

Permeando essa mobilidade democrática e nos moldes típicos das desigualdades sociais, multiplica-se a demanda por moradia, educação, saúde, transportes, água e esgoto.

O fenômeno ocorre também em outros aglomerados urbanos, a exemplo da Região Metropolitana do Recife, formada pela capital e mais treze cidades.

Não é mais possível enfrentar os problemas físicos e sociais daí decorrentes nos moldes de algumas décadas atrás. Impõe-se o planejamento metropolitano, que oriente soluções de conjunto, consorciadas – utilizando, inclusive, a Lei de Consórcios Públicos que disciplina a ação combinada entre prefeituras, com ou sem a participação do Estado e da União federal.

De outra parte, quase na mesma proporção em que novas centralidades atraem empreendimentos imobiliários e tangem gente pobre para as periferias da s cidades, a região central concentra volume significativo de imóveis sem uso, que bem poderiam servir para a redução do déficit habitacional. Em São Paulo, capital, isso é evidente; o mesmo acontecendo no Recife.

O Estatuto da Cidade concede ao gestor municipal instrumentos jurídico-formais que lhe permite intervir nesse sentido, pactuando soluções que reduzam ou até eliminem, nessas áreas, a manutenção de imóveis vazios por especulação ou por pendências burocráticas e legais. Em muitas cidades, o Plano Diretor aponta nesse sentido.

Assim, são dispositivos hábeis o direito de preempção, que dá preferência ao poder público na aquisição de imóveis urbanos; as operações urbanas consorciadas, que ensejam intervenções articuladas entre o poder público e a iniciativa privada; o consórcio imobiliário, que permite ao proprietário transferir seu imóvel ao poder público e receber, em contrapartida, pagamento através de unidades imobiliárias urbanizadas ou edificadas.

Agir nessa direção é ferir um problema crucial das populações urbanas no Brasil dos nossos dias – a ocupação e o uso do território. Em outras palavras, é dar passos concretos no sentido da realização de Reforma Urbana democrática, que estenda a todos o direito à cidade mais humana.

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