Indo para o Espaço

Pelo andar das articulações no plano terrestre, o que vai para o espaço agora não é foguete algum, mas o próprio Programa Espacial Brasileiro, há décadas sob pressão. Esta pedra foi cantada aqui, no Vermelho, ainda antes da nebulosa explosão do VLS (Veículo Lançador de Satélites) na base de Alcântara, no Maranhão, em 2002.

O novo presidente da Agência Espacial Brasileira (AEB), Marco Antônio Raupp, e o ministro da Ciência e Tecnologia, Aloísio Mercadante, já deram sinal verde para colocar o controle tecnológico desta área nas mãos da iniciativa privada. E esta a gente sabe qual é.

É conhecido o fato de que os Estados Unidos sempre foram contra programas espaciais em países fora do círculo imperialista. Mas o Brasil sempre teve atenção especial, como demonstram as diversas tentativas de interferência no projeto brasileiro, que agora parecer frutificar.

Os argumentos começam pelo de que o foguete brasileiro “provocaria instabilidade militar na América do Sul”. Mas, no fundo, o que pesa é o aspecto econômico, que fere os interesses da indústria bélica dos EUA, que é a base maior da estrutura de poder daquele país, o que explica seu orçamento militar, que é maior do que o do resto do mundo junto.

Além do mais, o país que tiver capacidade de lançar satélites para fins não-militares terá a chance de entrar num ramo de negócios que movimenta por ano a bagatela de 7 bilhões de dólares. E o Brasil já estaria bem perto disso, não fosse a conivência de alguns de nossos governantes, em especial FHC, e atitudes práticas de boicote e coação, aqui e no plano internacional.

No plano internacional, é usado o Tratado de Controle de Mísseis, um acordo multilateral imposto pelos EUA ao resto do mundo, cujas origens estão no tempo da Guerra Fria.

O ex-presidente FHC assinou esse tratado, já no primeiro ano do seu primeiro governo impondo regras para o setor. A justificativa era de que, assim, nos livraria de sanções que nos eram impostas lá fora por não sermos signatários do tal documento.

E, ao mesmo tempo, seu governo deixou o setor espacial brasileiro a pão e água, em muitos momentos, em especial após os malogros de 97 e 99, quando dois foguetes explodiram nos céus. Naquele tempo, parecia que os acidentes eram bem-vindos pelos detentores do poder.

Depois, antes da terceira tentativa de lançar o VLS-1, houve a explosão em terra, que matou 21 pessoas, entre as quais gente da primeira linha do projeto, mas todos brasileiros. Técnicos estrangeiros que lá se encontravam, inclusive da NASA estadunidense, não estavam por perto no momento da explosão.

Por fim, FHC assinou o Acordo de Salvaguardas Tecnológicas, que praticamente entregava a Base de Alcântara aos ianques. Denunciado quando ia sendo aprovado na surdina, o Acordo empacou no Congresso Nacional.

Pelo acordo assinado com os EUA, a atividade espacial em Alcântara passaria a ser controlada por eles. Sob o manto de “procedimentos de salvaguarda de tecnologias”, o documento assegurava, por exemplo, que o governo brasileiro “manterá disponível no CLA áreas restritas (…) e permitirá que pessoas autorizadas pelo governo dos EUA controlem o acesso a essas áreas”.

Estabelecia, também, que os técnicos brasileiros seriam obrigados usar crachás e teriam suas atividades delimitadas. Num acidente, por exemplo, nenhum brasileiro poderia tocar ou mesmo fotografar os escombros sem autorização dos americanos. Os equipamentos e outras cargas viriam dos EUA em contêineres lacrados, que só seriam abertos por americanos.

Tratava-se, em verdade, de uma espécie de contrato de arrendamento da base de Alcântara, restringindo o acesso brasileiro às tecnologias ali desenvolvidas ou usadas.

Em 2001, o acordo ia sendo aprovado na moita pelo Congresso Nacional, como mais um daqueles protocolos que o Itamaraty manda toda hora. O fato foi denunciado, porém, pela então deputada Socorro Gomes (PCdoB/PA), e entrou em avaliação. O relator, então deputado Waldir Pires (PT/BA), propôs revisão no acordo.

Tentativas posteriores também foram abortadas. Mas agora a mesma idéia voltou, de modo sutil e está emplacando sem passar pelo Congresso. É simples: só colocar empresas privadas nas funções-chaves do processo e está resolvido o problema.

Os foguetes e as cargas que estiverem carregando partirão de Alcântara apenas por facilidade e pela localização estratégica em relação ao posicionamento no espaço.

De resto, os cientistas brasileiros, a instituições nacionais envolvidas e o próprio Programa Espacial Brasileiro ficarão a ver navios.

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