Tsunami Nuclear

O dramático desastre sísmico no Japão, com seus trágicos efeitos sobre aquele povo, traz de volta, de cambulhada, o debate sobre o uso da fonte atômica para geração de energia elétrica. O rompimento de uma turbina em usina de Fukushima alarmou não apenas o Japão.

A primeira conclusão que se retira do acidente é a de que propalada segurança da tecnologia mais avançada nesse campo não é lá tão segura assim. Das 20 centrais nucleares da região mais afetada pelo terremoto e pelo decorrente tsunami, apenas nove seguiram funcionando.

Com isso, parte da cidade de Tókio, a capital, e outras oito cidades de médio e grande portes ficarão sem eletricidade pelo menos até o final de abril. A previsão é da empresa Tokio Eletric Power Co. (Tepco), que opera parte da energia distribuída naquele país, inclusive a dessa usina.

O físico brasileiro José Goldemberg, reverenciado mundo afora, disse que o ocorrido em Fukushima “é o maior acidente nuclear desde Chernobyl”. Ele se referia ao episódio de 1986, quando houve o vazamento de um reator de usina daquela cidade da Ucrânia, com gravíssimas conseqüências até os dias de hoje.

Outro físico brasileiro, o também respeitado Luiz Pinghelli Rosa foi um pouco além. “O que houve neste caso foi falha técnica, a tecnologia empregada é que falhou”, afirmou ele em entrevista à imprensa. Governos também reagiram. O da Alemanha decidiu fechar duas de suas usinas, consideradas obsoletas.

O governo japonês foi cauteloso ao tratar do caso, decerto por não querer mudar o foco das atenções sobre os demais efeitos do terremoto e do tsunami. No entanto, de imediato adotou medidas que, pelos remédios prescritos, davam dicas sobre o tamanho do mal.

No momento seguinte ao terremoto, já se tinha como certo que aquela usina havia sido atingida. Depois, surgiu imensa nuvem de fumaça, seguida de labaredas incontroláveis. Era novo alerta. Primeiro, o governo determinou medidas de proteção numa faixa de 10 km ao redor da usina, cuja população foi retirada.

Poucas horas depois, porém, a faixa de proteção foi ampliada para 20 km e o governo anunciou a distribuição de iodo às populações mais próximas. O iodo é para conter problemas de tireóides, que são os primeiros a surgirem com a contaminação. Em seguida, vem a alteração do tecido do corpo humano, que apodrece, e, mais além, altera o próprio código genético dos sobreviventes.

No dia seguinte, as autoridades japonesas que formam uma comissão de emergência para o aspecto nuclear do desastre pediu ajuda aos Estados Unidos. E solicitou que a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), da ONU, enviasse especialistas para avaliar a situação.

A agência da ONU se apressou em tranquilizar o mundo ao negar a possibilidade de Fukushima ganhar a dimensão de acidente internacional. De todo jeito, o chefe do gabinete nuclear, com status de ministério no governo japonês, Yukio Edano afirmou que o reator mais danificado ainda não havia sido “examinado diretamente” até terça-feira.

Na visão de Pinghelli Rosa, porém, alguns fatores já são suficientes para se colocar em cheque a segurança na usina. Os primeiros reatores dali foram instalados em 1971, período em que o Japão engordou investimentos na energia nuclear, que hoje representa ¼ da eletricidade consumida no país.

As falhas técnicas evidenciadas, no entanto, são quase primárias. Os reatores onde ficam as varetinhas do minério radioativo sobe a temperaturas de 1.200º para produzir o vapor que move a turbina. Para não explodir, esse cilindro nuclear é refrigerado por água. E aí começa o problema.

O reator, como a usina inteira, havia sido atingido pelo tremor de terra e pela onda gigantesca. Logo depois, a pressão no interior da caixa de proteção causou a primeira explosão, que foi mostrada na TV e em todo canto.

Para ligar a bomba de água e fazer o resfriamento, já que a usina não estava gerando energia, foi usado um gerador de emergência. Ocorre, porém, que o gerador dali é movido a óleo, que logo acabou. Não havia grande estoque por perto, nem como trazer de outras áreas, por impossibilidade de transporte.

O que ficou em cheque, porém, não é a bomba d’água ou o gerador. O que se questiona é o sistema de resfriamento, que é usado na maioria das centrais nucleares do mundo, inclusive nas usinas Angra I e II, no Brasil.

Assim, o debate foi reaberto. É claro que não se sabe qual seria, por exemplo, o efeito de um terremoto de 9º na região da maior hidrelétrica do mundo, a Três Gargantas, na China. Aquela parte do planeta é muitíssimo mais suscetível a sismos do que a fronteira trinacional em Foz do Iguaçu, no Paraná.

Por isso, não carece citar a nossa Itaipu, a segunda maior. Mas a pergunta é a mesma: a barragem do rio Azul suportaria um tremor desses? O efeito de um rompimento desse tamanho, em qualquer hidrelétrica do mundo, seria um tsunami de água doce com dimensões incalculáveis.

Ou seja, volta forte o debate sobre energia nuclear, que hoje já seria uma fonte limpa e, em tese, muito segura.

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