Pare o mundo que eu quero descer pra virar lenda
Os assuntos são inúmeros. Deixam a gente zonza. Informação demais em algum momento nos exaure. Mas muvuca pouca é besteira. A vida política do país está uma zoeira só. Em horas assim tenho vontade de sumir e virar lenda. Em nome da honestidade intelectual digo que está difícil demais focar em apenas um assunto para palpitar. Tentar, até que tentei.
Publicado 03/11/2009 22:42
"O Brasil caiu nove posições no ranking global de desigualdade entre os sexos organizado pelo Fórum Econômico Mundial, ocupando a 82ª posição entre 136 países." Piorou demais. Em 2006, o Brasil ocupava a 67ª posição; em 2007, a 74ª; e, em 2008, a 73ª. As principais razões apontadas para a queda em 2009 foram a diferença de renda obtida pelo mesmo tipo de trabalho de acordo com o gênero (da 100ª para a 114ª colocação) e a queda da renda estimada anual (da 54ª para a 69ª posição). O Brasil está atrás do Equador, Argentina, Costa Rica, Peru, Nicarágua, El Salvador, Paraguai, Chile e da República Dominicana. Em minha modesta e irada opinião, o governo precisa se explicar. Ou não?
Jornais brasileiros impressos, sites e blogs nacionais veicularam que o governador do Mato Grosso do Sul, André Puccinelli (PMDB), em reunião com empresários e industriais em Campo Grande, dia 22.9.2009, disse que o ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, "é veado e fuma maconha" e que se Minc comparecesse à Meia-Maratona Internacional do Pantanal, em 11.10.2009, ele "o estupraria em praça pública". O desfecho também é de domínio público. O governador lamentou a "conotação de ofensa" atribuída a suas declarações. É de estarrecer! Ficou o dito pelo não dito.
"O governador do Paraná, Roberto Requião (PMDB), disse no programa ?Escola de Governo?, veiculado pela TV Educativa do Paraná, que o câncer de mama em homens deve ser ?consequência de passeatas gay?" (27.10.2009). Nota pública do governador: "O tom lúdico que usei no lançamento da campanha de prevenção do câncer de mama, entre mulheres e homens, acabou provocando uma onda de recriminações. Quando me referi às paradas da diversidade, ocorriam-me os riscos que o abuso de hormônios femininos, com fins terapêuticos ou estéticos, representam para a saúde. Entre os riscos, o câncer de mama. Em razão disso, estou sendo impiedosamente criticado". Muita água ainda pode rolar. É esperar.
"Aluna da Uniban ameaçada de estupro no campus por usar minissaia – após ser ameaçada por outros estudantes da Uniban, a garota é escoltada pela polícia" (28.10.2009). É uma estudante de turismo da Uniban, de São Bernardo do Campo (SP). Segundo o secretário-geral da instituição, "A aluna veio trajada de uma determinada forma e isso provocou os alunos… Ela deu causa, ela deu motivos". Em seguida, amenizou: "Também não era motivo para tanto alvoroço". Um vídeo sobre o episódio "mostra o intenso movimento dos estudantes no pátio central da faculdade e a estudante saindo escoltada pela polícia aos gritos de ?puta! puta!?".
Aí, meus sais! É pra rasgar dólar e cuspir bala. Quero Sílvio Brito cantando "Pare o mundo/ Que eu quero descer/Que eu não aguento mais"… Gostaria que as notícias acima não tivessem nada a ver uma com a outra. Todavia, elas estão entrelaçadas e revelam as garras de uma sociedade patriarcal e homofóbica; expõem, numa crueza que dói, suas entranhas, que têm na repressão da sexualidade uma forma eficiente de manutenção do estigmatizante do tido como diferente. Não é tudo, mas é por aí.