Ensino bunda

O Prova Brasil, exame aplicado em 1,9 milhão de alunos da 4ª série e 1,3 milhão da 8ª série das escolas da rede pública e rural de mais de 5.300 municípios, apontou que os alunos têm rendimento "críti

Pesquisa que embasou o Projeto Brasil 3 Tempos (2007-2015-2022), do governo federal, indicou investimentos em educação e melhoria do ensino como prioridades entre os problemas principais do país, seguidos de violência/criminalidade, desigualdade social, emprego e saúde. Contudo, embora seja uma constante na preocupação dos brasileiros, a educação não é um dos itens que levam um eleitor a votar num determinado candidato – os pesquisadores afirmam que os candidatos devem tratar da educação nos seus programas de atuação, mas não fazer dela o carro chefe.
Dos atuais candidatos à Presidência da República, o professor Cristovam Buarque, chega a absolutizar a educação, afirmando que a sociedade já não é dividia em classes, mas entre os que têm e os que não têm conhecimentos! Para ele, "a educação é a porta para o país deixar de ser atrasado pela deficiência, desigualdade, dependência e corrupção." E colocou a própria disputa eleitoral num segundo plano: "Não estou apenas disputando eleição, estou numa cruzada pela educação."
A absolutização do tema, contudo, não condiz com a realidade do tempo e da história. As classes sociais estão aí, em disputa entre modelos de inserção e de exclusão social. Trabalhadores querem mais empregos, melhores condições de vida e trabalho; proprietários dos meios de produção insistem em buscar o lucro máximo, utilizando os avanços tecnológicos e científicos para diminuir o número de trabalhadores, alocando recursos no que mais rápido multiplique seus capitais. O constante aumento da desigualdade é o resultado prático – e na leva dos desempregados estão inclusive trabalhadores com formação escolar.
Também não é correto considerar a educação como uma panacéia universal. Não eram incultos os fascistas que apoiaram Mussolini; não eram ignorantes os alemães que seguiram Hitler. Assim como não são rudes os norte-americanos que mantêm Bush na presidência dos Estados Unidos e nem são analfabetos os judeus que se deixam guiar pela crença de serem “o povo eleito” para justificar o massacre de palestinos. A ideologia de uma época é a da classe dominante e à classe que se baseia na opressão e exploração interessa reproduzir ideologia que dê sustentação aos seus intentos.
No entanto, a educação é imprescindível. O filósofo francês Claude Adrien Helvétius (1715-1771) propunha que a educação levasse os homens a fazer com que seus interesses individuais coincidissem com os interesses da coletividade. Para ele, “a força da educação faz os ossos bailarem”. Epicteto, um ex-escravo que nasceu no primeiro século da era cristã, afirmava que “só as pessoas que receberam educação são livres”. Friedrich Engels escreveu que “desde que o socialismo se tornou ciência, é necessário tratá-lo como ciência, isto é, estudá-lo”. E a situação da educação no Brasil, o próprio exame governamental o demonstra, é lastimável. “Em vez de fazer as crianças avançar, a escola pública brasileira segue produzindo analfabetos”, vituperou o ex-diretor de Avaliação da Educação Básica do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira, Carlos Henrique.
Além de problemas na própria formação dos professores, das escolas públicas brasileiras, 22 mil não têm banheiro e 27 mil não têm energia elétrica – não está se falando aqui da falta de bibliotecas, aparelhos e instrumentos educacionais, material escolar etc. A gravidade da situação leva a que 52% (média brasileira, ainda maior no Nordeste) dos alunos de escola pública cheguem à quarta série sem saber ler e escrever.

O escritor português do século XIX, Alexandre Herculano, chamou de “língua bunda” o português, usando um termo angolano para referir-se ao descaso com que as escolas de Portugal estavam relegando o ensino do idioma nacional. Já o professor brasileiro Dionísio da Silva deplora: “A decadência do ensino médio não precisa de estatística. Era ali que antigamente era ensinada a língua portuguesa”. E indica: “No caso da norma culta da língua portuguesa, o caminho é a escola! É a relação bunda-cadeira-hora, que valoriza a inteligência, não a esperteza, a burla, o atalho, enfim um conjunto de trapaças que põe em vantagem o esperto e trata o estudioso como bobo”.

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