China: as infra-estruturas como essência do fenômeno

O pós-crise financeira asiática de 1997 foi marcado – para o caso chinês – pela decisão não ortodoxa de alavancar seu mercado interno pela geração de renda e produto, e o meio para tal foi a colocação em prática de um extenso programa de investimentos em

O financiamento das obras na China é marcado pelo caráter basicamente público dos investimentos. Isso se explica pela existência de um forte estado nacional e de uma taxa de juros atraente ao crédito, mediado por um sistema estatal de intermediação financeira pronto para carrear recursos para os setores estrangulados da economia, no caso, as infra-estruturas.


 



Preferência por O. Lange a F. Von Hayek


 


 


Joint-ventures são utilizadas para a aquisição de tecnologia moderna. Como exemplo, pode-se citar o caso da Siemens no metrô de Xangai e na importação – planejada pela China – na década de 1990 de máquinas e equipamentos. A não-importação de equipamentos com similar nacional está mais ligada aos objetivos estratégicos do Estado nacional chinês que aos custos de produção e distribuição internos, combinando assim formação bruta de capital intensivo com efeitos multiplicadores na economia. Os chineses estão muito mais para o socialismo de mercado de Oskar Lange do que para o liberalismo de Friedrich von Hayek.


 


 


Outro lado da moeda reside no fato de que com a “litoralização”do interior chinês, o suprimento em energia e transportes tornou-se crucial. Atestamos que durante 25 anos o litoral chinês criou as condições objetivas sob a forma de acúmulo de capital, para em seguida literalmente financiar o desenvolvimento do interior. A liquidez do empreendimento está na troca de capitais e tecnologia do litoral por recursos enérgicos abundantes do oeste.


 


 


A formação nas próximas décadas de uma economia continental chinesa espelha-se no mesmo processo verificado nos Estados Unidos na segunda metade do século 19. Da mesma forma que os Estados Unidos escolheram Chicago para ser o centro dinâmico de sua expansão para o oeste, a China escolheu Chongqing. Como Chicago, Chongqing está localizada no meio-oeste do país e desde 2001 tem recebido do governo central investimentos anuais da ordem de 20 bilhões de dólares.


 


 


De forma geral, destacam-se a construção da usina de Três Gargantas, o gasoduto Xinjiang-Xangai, a ferrovia de 1.125 quilômetros ligando Qinghai ao Tibete, onde 80% do trajeto ocorre acima de 5 mil metros de altura, em permaforst (terra com gelo permanente e ar rarefeito). Sobressaem-se ainda a construção de 2.500 quilômetros de trilhos oeste-leste e sete corredores rodoviários leste-oeste.


 


Entre 1998 e 2005, a China investiu 800 bilhões de dólares em infra-estruturas, enquanto o Brasil, com estrangulamentos no setor datados do início da década de 1980, investiu no mesmo período exatamente 18 bilhões de dólares, ou 2, 2% do montante chinês.


 



Comparação com o Brasil e o recado de I. Rangel


 


Para o caso brasileiro, as condições para o enfrentamento do nó infra-estrutural já estavam dadas no final da década de 1970 com a implantação no governo Geisel de um novo Departamento 1 (indústria mecânica pesada).


 


Tal enfrentamento foi inviabilizado por sucessivas políticas de “estabilização” financeira, de “combate à inflação”pela via da compressão de demanda e abertura comercial e, conseqüentemente, pelo abortamento de um capitalismo financeiro brasileiro. Para Ignácio Rangel – o maior economista brasileiro do século passado –, a tônica desse processo é a desnacionalização de todos os ramos fundamentais da economia, transferidos para o comando externo pela mão do Estado, viabilizando um dumping sem precedentes na história recente.


 


Nota


 


Esse artigo foi originalmente publicado na edição n° 26 (setembro de 2006) na revista Desafios do Desenvolvimento, publicação mensal de informações e debates do IPEA (Instituto de Política Econômica Aplicada) e do PNUD (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento).

As opiniões expostas neste artigo não refletem necessariamente a opinião do Portal Vermelho
Autor