O anticomunismo grosseiro de Eugênio Bucci

 

Eugênio Bucci, professor de comunição que influencia as novas gerações de jornalistas com seus livros e aulas, vendeu sua força de trabalho para um panfleto anticomunista publicado pelas Organizações Globo, a edição do semanário Época que teve por capa “PCdoBolso”, onde estava estampada uma adulteração da logomarca do PCdoB. Os editores determinaram ao professor (de pronta obediência) que escrevesse “Por que roubam os comunistas?”.

O título já nos classifica, a mim a vocês, camaradas, como ladrões, e o autor, talvez com conhecimento de causa (no artigo, ele insinua já ter compartilhado esperanças de uma sociedade melhor, ou seja, não capitalista), propõe-se explicar porque roubamos.

Primeiro, faz digressões para mostrar intimidade da produção cultural, em especial cinematográfica e livresca. Tenta valorizar-se enquanto testemunha não só pessoal, mas intelectual – afinal, é professor universitário, autor de livros adotados em escolas e até participou do Governo Lula, como diretor da Rádio Nacional (onde conheceu o governo por dentro. Como dizia o humorista Leon Eliachar a respeito das mulheres que terminavam o relacionamento com ele, Bucci está “cuspindo no prato que o comeu”).

Segundo o artigo na Época, quando Che morreu (em 1967, Bucci tinha 9 aninhos, mas acusa), “os ladrões proliferaram nas fileiras de esquerda. Rechonchudos e felizes. Não roubaram apenas automóveis, mas utopias. Transformaram sonhos dos camaradas em butim. Estão por aí, de terno, gravata e dinheiro vivo dentro de casa. Nisso se resume o grande dilema existencial e político das organizações de esquerda”. Vale lembrar: nesse período, alguns “rechonchudos e felizes”, no Brasil, perseguidos nas cidades, estavam se deslocando para o Sul do Pará, onde aconteceu anos depois a Guerrilha do Araguaia, onde menos de uma centena de “ladrões de utopia” enfrentaram milhares de militares em defesa da democracia e do povo. Mas isso são fatos, que prejudicariam as acusações de Bucci.

Segue o formador de profissionais de comunicação: “Passemos ao Brasil de 2011. Passemos para hoje. Estamos aí atordoados com mais um escândalo, outra vez embaralhando ONGs, mas agora com militantes e ex-militantes do PCdoB e autoridades do Ministério dos Esportes. Passarão meses, talvez anos, até que saibamos quem de fato tem culpa no cartório, se é que o tabelião e os cartorários não estavam no esquema. Desde já, porém, sabemos que há milhões e milhões de reais em irregularidades, tudo em nome de dar assistência a crianças carentes que não recebiam assistência nenhuma”.

Uau! O escriba se protegeu! Não a ponto de investigar que o ministério não é “dos Esportes”, mas “do Esporte”, mas a afeição à exatidão anularia todo o seu bolodório. Nunca saberemos o que de fato aconteceu, já que até “o tabelião e os cartorários” estavam no esquema que ele não conseguiu comprovar, mas que a família Marinho e os outros donos da mídia monopolista que emprega gente como Bucci dizem ser verdade, e ponto final. O mentor de hordas de jornalistas descomprometidos com a apuração dos fatos já se traiu, em outros momentos, defendendo uma “objetividade” alheia aos fatos, e que este seu texto mostra ser uma farsa, como as muitas da ideologia burguesa, desde que se tornou reacionária. Escreveu ele, em, “A missão de servir ao cidadão e vigiar o poder” (25/9/2007) que “os veículos jornalísticos, na busca de aperfeiçoar os parâmetros de sua governança, vêm desenvolvendo métodos que garantem independência de gestão editorial em relação não apenas às intervenções dos anunciantes, mas também às interferências – demandas extra-jornalísticas – dos acionistas” (não tem como nomear quaisquer desses veículos).

Continua: “Apartidário, equilibrado – e livre. Se quer ser fiel à sua responsabilidade social, o jornalista não deve permitir que agendas, causas ou doutrinas totalizantes de uma parte da sociedade – venham elas de ONGs, de igrejas, de governos, grandes corporações, de partidos, de onde vierem – contaminem seu trabalho. É mais adequado que ele procure desvincular-se material e formalmente desses pólos de poder e de influência, sem que isso signifique desmerecer a legitimidade que eles têm”.

O jornalista é, portanto, um ser humano sem causa, sem doutrina, sem governo, sem patrão, sem partido, sem religião, sem ONG. Apesar de um mal tamanho, Bucci ainda deu uma entrevista, no dia seguinte, afirmando: “A comunicação pública só irá vingar entre nós se for independente, tanto dos governos quanto dos mercados, se for gerida com austeridade, se for uma escola para novas linguagens, se encontrar sua especificidade insubstituível. Isso é possível, mas ainda falta muito chão”. Bem, falta chão, mas garante seu sustento, quando vende sua força de trabalho para a mídia monopolista e se torna teórico da ideologia capitalista, anticomunista, portanto.

Em sua diatibre contra nós, Bucci ainda diz que, mais do que ladrões de dinheiro, somos também de utopias. Estamos “por aí, de terno, gravata e dinheiro vivo dentro de casa”. Não vou aprofundar a “acusação” de que usar terno, gravata ou ter dinheiro vivo em casa é crime – até os Marinhos, Cívitas, Frias e Mesquitas, proprietários da mídia monopolista brasileira, devem ter sentido algum desconforto quando leram isso. Vamos analisar a questão da utopia.

Utopia se refere a um projeto de sociedade, justa, mas ainda inexistente. Neste sentido, os comunistas, materialistas dialéticos, superaram a visão sonhadora do projeto, e o trouxeram para o factível, mas levando em conta as circunstâncias em que as pessoas de fato vivem, para mudar a realidade circundante. Assenhoreados de tal visão, os comunistas atuaram no Ministério do Esporte, primeiro no Governo Lula, depois no Governo Dilma.

Uma Pasta que se voltava em especial para o esporte profissional e para a demanda dos desportistas de várias modalidades, passou a adotar, sob a gestão comunista, uma orientação de inclusão social, que tantos resultados positivos tem trazido para o país e seu povo.

Tratando o tema jornalisticamente, ouçamos pessoas que labutam na área. Não é um escriba de aluguel, mas a ex-jogadora de voleibol Ana Mozer quem, voluntariamente, testemunhou no Twitter: "Minha experiência com políticas públicas de esporte começou em 2000 e segue até hoje. (…) Nesses anos, vi o país avançar, participei de vários fóruns, encontros, conferências. O Brasil do esporte ampliou, aumentou a visibilidade. Se debateu mais, aumentaram as fontes de financiamento para ações de esporte. Concentrou no rendimento, mas também criou outras frentes. Ainda há muito a avançar, mas reconheço o trabalho de Orlando Silva e equipe. Que o próximo siga avançando".

Não posso deixar de testemunhar a alegria e orgulho que me proporcionaram a atitude do Orlando Silva, dirigente do PcdoB e ex-ministro do Esporte, que fez juz à tradição que vem de Dimitrov, na época do domínio nazifascista na Europa, de que “a defesa acusa” e partiu para cima de seus detratores durante o episódio que o levou a pedir demissão do Ministério. E também da garra revolucionária dos camaradas, amigos do Partido e democratas que, nas redes sociais e por todos os meios defenderam a causa revolucionária nesta que foi, ao que tudo indica, a maior operação de “cerco e aniquilamento” dos comunistas desde o ataque final da ditadura militar à gloriosa Guerrilha do Araguaia.

Henfil, o genial humorista, irmão do Hebert de Souza, criou nos tempos da ditadura militar um “cemitério dos mortos-vivos”, onde enterrava pessoas que, mesmo talentosas, acabavam prestando serviço aos algozes. Vez por outra, ressuscitava algumas, como Clarice Lispector e Elis Regina, porque elas – e não ele – haviam mudado de comportamento. Que Eugênio Bucci saia da vala comum. Pode ser bom para o país e os oprimidos, em que pese o que signifique para o seu “dinheiro vivo dentro de casa”, que poderá ser diminuído.

Lutemos pela verdade classista, também no Twitter: @Carlopo.

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