Renildo Calheiros chama de “perversidade” a reforma da previdência

Há pouco mais de um mês o governo Bolsonaro apresentou ao Congresso Nacional a proposta que altera na Constituição as regras de aposentadoria para o povo brasileiro. Para o deputado Renildo Calheiros (PCdoB-PE) a proposta elaborada pelo ministroda Economia Paulo Guedes “chega a ser uma perversidade” e terá dificuldades para ser aprovada no Congresso Nacional. Ele acha que os parlamentares têm receio de não ser reeleitos depois de votarem num projeto que retira direitos.

Renildo Calheiros - Foto: Richard Silva/PCdoB na Câmara

O projeto começa a tramitar na Câmara Federal, onde passará por duas votações e precisa ter no mínimo 308 votos favoráveis no plenário para ser aprovada. O número corresponde a 60% dos 513 deputados. Se aprovada pela Câmara, a PEC será enviada ao Senado Federal, onde passará novamente por suas votações e deverá obter 57 votos favoráveis.

"Não será algo tão simples. Os deputados que tirarem direitos do trabalhador serão lembrados na eleição. A maioria dos apoiadores da reforma trabalhista perderam seus mandatos na eleição passada", avalia o deputado Renildo Calheiros (PCdoB). "Não queremos que isso seja votado a toque de caixa. Queremos um amplo debate para que a sociedade tome conhecimento do tema e acompanhe as decisões tomadas", garante.

O PT, o PCdoB, o PSB, PDT e PSOL integram uma frente contrária à Reforma, pois avaliam que a reforma tira direitos da população. "Ela dificulta que as pessoas se aposentem e ainda diminuem o valor das aposentadorias", resume Renildo. Ele lembra ainda que boa parte dos aposentados ganham apenas um salário mínimo ou entre um e dois salários, o que reflete que parte considerável da população não tem condições de pagar ainda mais para a Previdência. "Com tanto desemprego e informalidade, essa reforma vai jogar milhões de brasileiros na falta de assistência".

Pontos críticos

Para quem contribui regularmente para a Previdência, o cálculo para se aposentar hoje se dá na "fórmula 86/96": a soma da sua idade com o seu tempo de contribuição deve dar 86 (para mulheres) e 96 (para homens). Mas na proposta do governo Bolsonaro, ninguém pode se aposentar antes dos 62 anos (mulheres) e 65 anos (homens). A idade mínima para aposentadoria hoje é de 55 anos (mulheres) e 60 anos (homens).

Pelas regras atuais, alguns trabalhadores que não conseguem contribuir formalmente com a Previdência, como donas de casa ou trabalhadores informais, podem se aposentar por idade aos 65 anos (homens) e 60 anos (mulheres) recebendo um salário mínimo – é o chamado Benefício de Prestação Continuada (BPC). Pela proposta de Bolsonaro, só teria direito a receber o BPC as mulheres com 65 anos e homens com 70 anos, mas ganhando apenas R$ 400 por mês. Os partidos de esquerda avaliam que, se a mudança das regras for aprovada, muita gente terá que trabalhar até seus últimos dias de vida sem direito à aposentadoria.

Esse ponto Renildo considera o mais difícil de ser aprovado, já que é motivo de discordância mesmo entre boa parte dos deputados apoiadores de Bolsonaro. "Quem se aposenta pelo BPC é aquela pessoa que é vulnerável, que chegou à idade avançada e não conseguiu nem mesmo contribuir pelo tempo mínimo. Essa pessoa se aposenta hoje aos 65, mas eles querem subir essa idade para 70 anos, dando a partir dos 65 um valor de apenas R$400", lamenta o parlamentar. "É apertar o pescoço de quem não tem de onde tirar. Chega a ser uma perversidade", opina. Ele diz que o país precisa continuar acolhendo a população mais pobre quando chega à velhice. "Não podemos deixá-los morrer de fome. É o mínimo que toda nação civilizada tem que fazer", pontua Renildo.

A situação fica ainda mais crítica se consideradas as realidades de quem trabalha no campo. Hoje os trabalhadores rurais, devido às características próprias de seu trabalho, não têm obrigatoriedade de contribuir diretamente para a Previdência. Basta que comprovem o exercício da profissão por 15 anos ou mais. Assim, homens a partir dos 60 anos e mulheres a partir dos 55 anos podem se aposentar. Mas com as regras propostas por Bolsonaro eleva-se o tempo mínimo de contribuição de 15 para 20 anos e muda-se as regras para comprovar o exercício da profissão, tornando mais difícil que os camponeses acessem a aposentadoria.

Em muitos estados do Brasil, especialmente nas regiões Norte e Nordeste, a expectativa média de vida está abaixo dos 70 anos, especialmente para homens. Em Pernambuco os homens vivem em média 70 anos e 5 meses, enquanto as mulheres vivem cerca de 78 anos.

A reforma da Previdência também propõe um novo regime previdenciário, o de capitalização. O atual regime é o de repartição, que tem por princípio a solidariedade: todos contribuem para o mesmo fundo, que será dividido proporcionalmente ao que cada pessoa contribuiu, mas sempre garantindo um salário mínimo àqueles que não puderam contribuir. Mas se o regime de capitalização for aprovado, os fundos passam a ser individuais, é "cada um por si". A proposta oferta ainda melhores condições para as empresas que depositarem os impostos previdenciários no regime de capitalização, ajudando a esvaziar o INSS. Assim sobrará cada vez menos recursos para os que não conseguem contribuir com a Previdência, aumentando as chances de receberem valores muito abaixo de um salário mínimo.

Sobre esse ponto, o deputado aponta para o Chile, que adotou o mesmo regime há décadas atrás. "Hoje a população idosa do Chile está desesperada. Porque as pessoas poupam o que lhe sobra, mas num país em que as pessoas ganham mal, vão poupar o quê? Então na velhice o sistema vai deixá-las desamparadas", afirma. Ele resume que a reforma tem como objetivo principal atender aos interesses dos bancos e das grandes seguradoras. "Se eles tornam a Previdência difícil de ser acessada para os trabalhadores de qualquer faixa de renda, a tendência natural é que as pessoas com condições um pouco melhores busquem as previdências privadas, que receberão trilhões de reais", diz o deputado. "A Reforma como um todo é muito ruim para o povo. É um compromisso das elites de dar mais dinheiro para os bancos, como se eles precisassem", finaliza.