Aldo Rebelo – Brasil e China em mundos paralelos

Construída para o projeto de desenvolvimento do Brasil, a Eletrobras pode terminar como patrimônio nacional chinês. Como uma gigante estatal brasileira do ramo de energia pode ampliar o patrimônio de uma gigante estatal chinesa.

Por Aldo Rebelo

(Foto: Reprodução)

O governo brasileiro enviou ao Congresso Nacional no último dia 5 de novembro a proposta de privatização da Eletrobras, a gigante estatal do setor elétrico responsável pela geração, transmissão, distribuição e infraestrutura da energia elétrica no Brasil.

Criada em 1962 para coordenar e integrar as diversas empresas do setor, a Eletrobras – Centrais Elétricas Brasileiras é uma sociedade de economia mista e de capital aberto sob controle do governo federal, constituída como instrumento do projeto nacional de autossuficiência energética para o desenvolvimento.

Posta à venda a estatal brasileira, outra estatal, esta chinesa, a State Grid, anunciou a disposição de incorporá-la aos seus ativos, já numerosos no Brasil. A gigante chinesa é a maior empresa do mundo em transmissão e distribuição de energia, com 1,5 milhão de funcionários, e além da Eletrobras manifestou também interesse em Furnas, outra estatal de propriedade do governo de Minas Gerais.

A gigante estatal chinesa pode incorporar a gigante estatal brasileira.

O que explica o fato de o Brasil transferir patrimônio estatal brasileiro para uma empresa estatal chinesa? A existência de dois mundos paralelos que orientam as elites dirigentes na China e no Brasil.

Na China o governo se apoia firmemente em suas gigantescas empresas estatais e privadas, reunidas sob o denominador comum do interesse nacional chinês.

No Brasil o Estado e as empresas estatais sofreram a mais sórdida campanha de demonização e depreciação de imagem sem paralelo no mundo. Operações policiais e midiáticas não separaram crimes cometidos por executivos, das marcas empresariais, levadas à ruína juntamente com a imagem de seus dirigentes.

Os chineses retiraram centenas de milhões de seus compatriotas da pobreza ao mesmo tempo em que já somam mais bilionários entre seus cidadãos do que os Estados Unidos da América.

Não é a China comprando o Brasil. É o Brasil posto à venda pelo governo.

Aqui, a onda de desorientação criou uma contradição antagônica entre Estado e mercado, pela qual um precisa ser destruído para permitir a sobrevivência do outro, quando na verdade Estado e mercado devem atuar subsidiariamente em benefício do interesse nacional.

Certa vez ouvi de um embaixador chinês que durante a construção de Itaipu era comum a presença de delegações chinesas para testemunhar o feito da engenharia brasileira. Não é apenas a engenharia dos nossos exímios barrageiros que se vai com a Eletrobras. Vai-se também a bela experiência de integração de uma rede de transmissão complexa em país-continente como o Brasil.

No Brasil a desorientação produz uma espécie de política pública esquizofrênica, pela qual um braço do Estado busca investimentos privados enquanto o outro os inviabiliza no labirinto de normas reguladoras e atribuições abusivas de corporações hipertrofiadas em suas atribuições fiscalizadoras.