STF é chamado a honrar Constituição no exame da prisão em 2ª instância

Em entrevista à Rede Brasil Atual, em abril do ano passado, o advogado e jurista Celso Antônio Bandeira de Mello, que encabeça à Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) 54, ajuizada pelo PCdoB no Supremo Tribunal Federal (STF), contra a prisão após a condenação em segunda instância, disse na ocasião que a petição apenas quer que a corte “afirme que é constitucional o que está na Constituição”.

Por Iram Alfaia

Supremo Tribunal Federal STF justica - Foto: Agência Brasil

Nesta quinta-feira (17), além da ADC 54 do PCdoB, o STF vai analisar as ADCs 43 e 44, do Patriota, que substituiu o Partido Nacional Ecológico (PEN), e do da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), respectivamente.

“Em síntese, as ADCs 43, 44 e 54 pedem simplesmente o respeito à Constituição de 1988, à lei e ao Congresso Nacional”, diz o jurista Lenio Luiz Streck, professor de Direito Constitucional e pós-doutor em Direito, um dos autores da petição da OAB.

Nas 19 páginas da ADC 54, Celso Bandeira de Mello, Geraldo Prado, Gabriel de Carvalho Sampaio, Weida Zancaner Bandeira de Mello, Michel Saliba Oliveira e Paulo Machado Guimarães, pedem aos ministros do STF que declarem a constitucionalidade do artigo 283 do Código de Processo Penal (CPP), cuja redação foi dada pela Lei 12.403, de 4 de maio de 2011:

“Ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, em decorrência de sentença condenatória transitado em julgado ou, no curso da investigação ou do processo, em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva”.

Na petição, os autores esclarecem que o artigo 283 está “umbilicalmente ligado ao que dispõe a Constituição no artigo 5º inciso LVII: “Ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”.

“Essa é a ação mais simples do mundo”, disse Celso Bandeira de Mello, para quem é difícil não estar otimista com o pedido para se declarar “constitucional o que está na Constituição e aquilo que está na lei repetindo a Constituição”.

Na peça, eles também identificam que se formou na corte a posição majoritária de que o artigo 283 do CPP é compatível com artigo 5º, inciso LVII, da Constituição. Somente os ministros Luis Roberto Barroso e Luiz Fux não chegaram a esse entendimento.

“É indiscutível, diante desse cenário, que é inconstitucional a determinação da execução da pena após decisão de segundo grau de forma automática – sem fundamentação a justifica-la. Apenas dois dos onze ministros desta Suprema Corte sufragaram entendimento em sentido contrário”, identifica a petição.

No campo do Direito, a petição ajuizada pelo PCdoB diz que a Constituição de 1988 estabelece a dignidade da pessoa humana como um dos fundamentos do Estado Democrático de Direito.

Alega-se ainda que o princípio da presunção da inocência está inserido na ordem constitucional brasileira no artigo 5º, inciso LVII, já tendo sido objeto de assento na Declaração Universal dos Direitos Humanos e na Convenção Americana sobre Direitos Humanos.

Benefício ao ex-presidente Lula

Entre os próprios autores das ADCs não há dúvida de que as ações, no caso de serem aceitas pelo STF, irão beneficiar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, preso político após condenação em segunda instância.

No entanto, negam relação delas com a situação processual do ex-presidente. “É importante ressaltar que quando entramos, em 19 de maio de 2016, com a ADC 43, em nome do PEN, o ex-presidente Lula sequer havia sido denunciado”, disse ao Conjur o criminalista Antônio Carlos de Almeida Castro (Kakay).

“Essa ação em momento algum visou beneficiar o Lula. Sempre ressaltamos que o principal interessado era o cliente tradicional do processo penal no Brasil, o negro, o pobre, aquele sem rosto e sem voz. Se ele posteriormente veio a ser condenado era algo que não poderíamos prever. É claro que todos, indistintamente, têm o mesmo direito de usufruir de uma decisão do Supremo Tribunal”, justificou.

“Lembro que, quando fizemos a petição, não estava em jogo a liberdade do ex-presidente Lula. Depois é que isso passou a politizar o debate. Pensamos sempre nas centenas de milhares de pessoas presas indevidamente. Esperamos, agora, que o STF julgue tecnicamente. Que entenda, simplesmente, que onde está escrito 'presunção da inocência' se leia 'presunção da inocência'. Nem uma letra a mais, nem uma letra a menos”, argumentou Lenio Luiz Streck.