No Equador, Moreno se curva ao FMI para fazer arrocho

Por Hora do Povo

Emblema do Fundo Monetário Internacional na sede da organização em Washington

Presidente do Equador, Lenin Moreno, dizendo “sim, senhora” à gerente do FMI, Christine Lagarde. (Arquivo ComunicaciónEC)

O presidente do Equador, Lenin Moreno, acatou integralmente o pacote neoliberal de “reformas” trabalhista e tributária ditado pelo Fundo Monetário Internacional (FMI) para tomar de assalto a economia do país andino, assumindo entre outras mazelas a política de arrocho salarial, precarização e desemprego, contra trabalhadores públicos e privados, e corte nos subsídios de combustíveis.

A direção executiva do FMI anunciou em março a aprovação deste acordo de US$ 4,2 bilhões, que se soma a outros US$ 6 bilhões provenientes de outras instituições financeiras – igualmente desinteressadas – como o Banco Mundial, o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e o Banco Europeu de Investimentos (BEI). Moreno celebrou o fato do país abrir mão de sua soberania política em troca de alguns caraminguás: “Que grande notícia!”

Para o economista equatoriano Erik Mozo a capitulação era completamente desnecessária, sendo tomada apenas por países cujas “condições financeiras são bastante complexas e graves”. Muito diferente disso, o Equador tem registrado um crescimento econômico constante nos últimos anos.

“Acordar com o FMI, aumentar o desemprego e a pobreza, governar com e para os adversários de direita e os Estados Unidos, entregar Julian Assange e aprofundar a perseguição contra opositores são as características dos dois anos de Moreno, um giro total à direita”, assinalou o jornalista Eduardo Tamayo.

De acordo com o Banco Central do Equador (BCE), nesta última década, o ano com maior aumento do Produto Interno Bruto foi 2011, com 7,9 %, havendo contração somente em 2016, de 1,2%, devido a uma conjunção de fatores: queda dos preços do petróleo, valorização do dólar e a um terremoto que devastou o país, afetando mais de um milhão de pessoas.

CONTRADIÇÕES

Em relação aos dados da dívida pública há divergências nas mesmas publicações do Ministério da Economia e Finanças, variando conforme a fonte. Segundo as cifras apresentadas pelo governo de Correa, em março de 2017 o endividamento alcançava 27,3 % do PIB; porém a administração de Moreno publicou novos dados, fazendo um “recálculo”, e assinala que nesta mesma data a dívida era de 41,3 % do PIB. Esta foi a fórmula do atual governo reduzir o seu fracasso, já que a dívida pública equatoriana já está em 45,3% do PIB, conforme dados de março deste ano. Assim, o aumento teria sido de tão somente 4%.

Moreno também tentou esconder que no primeiro trimestre de 2018 cerca de 504 mil pessoas a mais passaram à condição de pobreza e, delas, 185 mil passaram à de miserabilidade (enquanto nos dez anos anteriores 1,7 milhão de habitantes saiu da pobreza), aponta estudo da Faculdade de Ciências Econômicas da Universidade Central do Equador.

Mas o atual governo também derrubou as reservas internacionais que caíram de US$ 4,467 bilhões em junho de 2017, poucos dias após Moreno assumir a presidência, para US$ 3,885 bilhões em junho de 2019.

Na carta de submissão ao FMI, o governo equatoriano se compromete entre outras coisas a diminuir os ganhos e as contratações, através de “um cuidadoso reajuste da massa salarial por meio de uma estratégia que equilibre a restrição salarial”, com “renovar unicamente um de cada dois contratos que expirem nos setores não sociais” e de “harmonizar” [leia-se arrochar] os salários dos novos empregados do setor público aos do setor privado”.

A assinatura também obriga o país a “atualizar” – isto é alavancar – tarifas e bater de frente com os subsídios e a “normalizar” os preços do diesel de uso industrial, inviabilizando a indústria local e escancarando a economia para os importados. No ano passado Moreno retirou os subsídios do diesel e dos distintos tipos de gasolina para pescadores e fazendas de camarão, o que provocou um aumento imediato de 25% nos combustíveis.

Entre outras medidas contra o Estado, Moreno eliminou no ano passado 20 instituições como ministérios, secretarias, institutos e agentes dependentes e anunciou a disposição de privatizar a Corporação Nacional de Telecomunicações (CNT). Em março passado, o ministro do Trabalho, Andrés Madero, comemorou que somente entre dezembro de 2018 a fevereiro deste ano já havia despedido 11.820 trabalhadores do setor público.

ATAQUE AOS PISOS

“No país os salários do setor público, que evoluem em pisos de carreira, são proporcionalmente mais altos que os do setor privado”, recordou Erik Mozo, pois enquanto no privado o mínimo é de US$ 394, os servidores nível 1 do setor público ganham cerca de US$ 700. Assim como o arrocho salarial acordado com o FMI, o conjunto da reforma aponta para a “precarização”, condena, como a extensão da jornada de trabalho até dez ou doze horas diárias, incluindo os finais de semana. “Este é apenas o primeiro pacote de medidas de flexibilização laboral que se pretendem implementar. À medida que se vá aprofundando, irá haver mais desequilíbrios em matéria econômica, que repercutirão em desestabilizações sociais e políticas”.

A reforma elimina a sobretaxa para contratos casuais, com a modificação do artigo 17 do atual Código Orgânico do Trabalho, que estabelece que os trabalhadores sob esta modalidade têm um incremento salarial de 35% no valor da hora do salário base. Além disso, se cria um contrato de empreendimento, que poderia ser aplicado a novas empresas ou investimentos, ampliando a atual experiência de três meses para três anos.

“À medida que isto se aprofunde vai haver mais instabilidade em matéria econômica, que repercutirá em maiores desequilíbrios sociais e políticos”, acrescentou Mozo.

O programa acordado com o FMI tem uma duração de três anos e o cenário projetado, assumidamente, é de até quatro anos de estancamento econômico. A projeção do próprio FMI é de que haverá uma contração da economia neste ano de 0,5%, um leve crescimento de 0,2% em 2020 e tão somente em 2024 o PIB aumentará 2,1%.

“O que fazem fundamentalmente estas medidas é inibir a capacidade de consumo da sociedade, reduzindo também a produção e isso implica um colapso paulatino de toda a economia em seu conjunto, porque geraria diminuição econômica”, concluiu Mozo.