Encontro Lula Livre reforça mobilização pela soltura do ex-presidente 

Na semana em que a Lava Jato coleciona suas maiores derrotas em cinco anos de operação, partidos de esquerda e movimentos sociais elaboram estratégias para reforçar a campanha pela libertação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, preso desde abril de 2018 pela rede de intrigas montada pelos procuradores da República de Curitiba.

Lula livre - Ricardo Stucker

O Encontro Nacional Lula Livre, realizado neste sábado em São Paulo, abriu seus trabalhos com poesia, música e o sonho de um Brasil melhor. Trabalhadoras e trabalhadores que lutam pela liberdade, pela construção de uma sociedade justa e igualitária cantaram juntos. Entre eles, integrantes da Mangueira, a escola de samba vencedora do carnaval do Rio de Janeiro.

Coube ao presidente do Instituto Lula, Paulo Okamotto, cumprimentar todos os que estão se organizando e ler uma carta enviada pelo ex-presidente. No início, ele lembrou, “vocês vieram para uma reunião de trabalho”, e complementou, “temos que continuar lutando pela liberdade do ex-presidente Lula e contra as políticas anti-povo do governo Bolsonaro”.

Okamotto disse que somente através dessa luta os assassinos de Marielle e a reforma da Previdência serão combatidos. Na carta, Lula agradeceu ao apoio que tem recebido e que é também a sua força para continuar resistindo. O ex-presidente disse o que vem se concretizando, que a cada dia todos veem que ele foi preso para que não pudesse se eleger presidente, que ele é vítima de uma farsa judicial construída com o apoio da grande mídia.

O ex-chanceler e ex-ministro da Defesa Celso Amorim, que preside o Comitê de Solidariedade Internacional a Lula e em Defesa da Democracia, afirmou ainda que a prisão do ex-presidente faz parte de um processo internacional de afirmação dos Estados Unidos como potência hegemônica, que por aqui conta com a conivência das elites brasileiras, e que se infiltra nas próprias instituições – setores do ´Poder Judiciário e do Ministério Público' – para alcançar os seus objetivos.

Dentre esses objetivos, destacou o ex-chanceler, está o desejo de acabar com o processo de inserção autônomo tentado pelo Brasil e outros países que buscaram alianças, como os BRICs, que acabam por afrontar a hegemonia norte-americana.

Outro objetivo, ainda mais grave, é se apropriar das reservas do pré-sal brasileiro, bem como das reservas petrolíferas venezuelanas. "Hoje é a Venezuela, amanhã é aqui. Por isso temos que defender a nossa soberania, defender o direito de fazer a nossa política. O direito de ter, sim, relações com os Estados Unidos, mas de igual para igual, não de maneira subalterna. Esse processo de dominação é global, mas em cada lugar atua de uma maneira, com aliados específicos. Aqui foram a mídia e setores do judiciário", afirmou.

Segundo Amorim, é preciso montar uma "ampla frente democrática, nacional e internacionalmente", para denunciar em todo o mundo as violações ao Estado de Direito que ocorrem no Brasil, que têm na prisão do ex-presidente Lula a sua face mais violenta.

"É preciso que a social-democracia europeia, por exemplo, compreenda o que está acontecendo no Brasil, que são falsas as acusações de corrupção, que o que houve foi um julgamento político. Lula é um prisioneiro político. É preciso que compreendam, porque eles têm influência sobre a nossa elite, a nossa mídia, os juízes do STF. Os ministros da nossa Suprema Corte não ficarão confortáveis quando forem questionados no exterior sobre o "Mandela brasileiro", mantido preso ilegalmente."

Guerra jurídica

A advogada Valeska Teixeira, que integra a defesa do ex-presidente Lula, relembrou o histórico de violações cometidas pela Lava Jato, desde 2014. Ela destacou que a denúncia que acabaria na condenação, começou no Ministério Público de São Paulo, baseada numa denúncia falsa da revista Veja. "Dali houve pressão irresistível para que a juíza do caso encaminhasse o processo para os procuradores do Paraná. Começa então o aprisionamento pela jurisdição de Curitiba."

Ela lembrou uma série de ações arbitrárias desencadeadas a partir de então. A principal delas, a condução coercitiva do ex-presidente, em março de 2016, quando também "jogaram todas as fichas" em ações de busca e apreensão contra familiares e colaboradores do ex-presidente, que nada encontraram de concreto.

"Em março de 2016, entendemos que havia um processo orquestrado para culpar o ex-presidente Lula e de alguma maneira manchar a sua biografia. Acusações e hipóteses não faziam sentido. Você comanda o maior esquema de corrupção da face da terra para ganhar um tríplex que você nunca teve, que não pode ser seu, a menos que pague?".

A Operação Lava Jato se torna então, uma "máquina de ilusionismo", com novas denúncias infundadas a cada dia, que impedem a população de acompanhar o desenrolar do processo.

Agora, após ter acesso ao conteúdo do acordo entre a Lava Jato e o Departamento de Justiça norte-americano, Valeska diz que, mais uma vez, ficou provada a inocência do ex-presidente Lula, já que não há ali comprovada qualquer relação do ex-presidente com ilícitos cometidos na Petrobras. A revelação que o empresário Léo Pinheiro pagou R$ 6 milhões a executivos da OAS para que estes confirmassem a sua versão de delação apresentada aos procuradores de Curitiba fragiliza ainda mais as acusações.

Sequestro

Para o coordenador nacional do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) João Pedro Stédile, Lula é "mais que um preso político", pois foi "sequestrado" pelas forças do capital, que se articulam desde Washington a Curitiba, para salvar o capitalismo da sua maior crise. Para tomarem fôlego frente à derrocada,acredita, essas forças agora avançam sobre as riquezas naturais e também sobre as estatais e os serviços públicos, que devem ser privatizados para garantir as "gordas margens" de lucro do sistema financeiro internacional. "Qualquer bandido, dos mais facínoras, dá entrevista. Lula não pode se comunicar com o povo brasileiro, porque representa um perigo para o projeto do capital."

Stédile também relacionou o avanço dessas forças no Brasil e na Venezuela, dizendo que a ex-presidenta Dilma Rousseff, deposta em 2016, foi a primeira vítima da sanha das potências estrangeiras pelo pré-sal brasileiro.

Ele também criticou o governo Bolsonaro, que não tem base social real, mas representa um amontoado de blocos conservadores evangélicos, militares e neoliberais. "Esses três blocos não se entendem. Não têm projeto e unidade política."

Para o coordenador do MST, esses desencontros na base do governo, somados às trapalhadas do "clã Bolsonaro", têm causado uma mudança de clima na sociedade brasileira, perceptível nas críticas que deram o tom no Carnaval. "Os ventos estão mudando, e mudando para o nosso lado."

Para Stédile, é preciso ampliar as mobilizações regionais pela libertação do ex-presidente Lula, a partir do fortalecimento de comitês estaduais e festivais. Ele também propôs a criação de uma cartilha, que aponte as violações que constam nos processos que condenaram o ex-presidente, de forma a municiar a militância de argumentos e para que exerçam a devida pressão sobre o Judiciário.