Proposta de Guedes amplia desigualdade e prejudica classe média

Coordenador do programa de governo de Jair Bolsonaro, o economista Paulo Guedes disse em reunião fechada que quer estabelecer uma alíquota única de Imposto de Renda de 20% para pessoas físicas e jurídicas. A informação está na Folha de S. Paulo desta quarta (19) e gerou polêmica, já que isso significaria acabar com a progressividade do tributo, ampliando desigualdades. Caso não haja aumento da faixa de isenção, há risco de ocorrer transferência de renda da classe média para os ricos.

“Essa proposta é inacreditável, é péssima, porque desconsidera a possibilidade de progressividade e de equidade nesse tributo. Os impostos sobre renda e propriedade são os que têm grande capacidade de reduzir desigualdade. Ter uma alíquota única quebra todas essas possibilidades e vai na direção contrária do que vemos no resto do mundo”, critica a assessora política do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), Grazielle David, em entrevista ao Portal Vermelho.

Atualmente, o Imposto de Renda é cobrado por faixas. Os contribuintes que recebem entre 1.903 e 2.826 são taxados em 7,5% de sua renda; aqueles que ganham de 2.826 até 3.751, pagam 15%; de 3.751 até 4.664, 22,5%; e, acima de 4.664, 27,5%.

Embora a proposta de Guedes não tenha sido detalhada no texto da coluna de Mônica Bergamo na Folha, implementar a taxa única de Imposto de Renda significa que, independente de receberem R$ 2 mil ou R$ 130 mil por mês, todos os contribuintes do Imposto de Renda pagarão os mesmos 20% de imposto. É um passo atrás na busca por justiça tributária, num país em que os impostos já pesam bem mais sobre os mais pobres.

E, caso não haja um aumento da parcela da população que hoje é isenta de pagar o tributo, a mudança significará ampliar ainda mais a tributação para os que ganham menos e hoje se enquadram nas duas primeiras faixas – a grande maioria da população – e reduzi-la para aqueles que recebem mais e estão nas duas últimas faixas atuais.

Em detalhes, seria diminuir o percentual do tributo para quem recebe a partir de sete salários mínimos, e aumentar para quem tem renda entre dois e sete salários mínimos. Na prática, uma desoneração do Imposto de Renda de Pessoa Física em benefício de quem recebe mais e em prejuízo de quem recebe menos. Um agrado da campanha de Bolsonaro para os mais ricos.

Algumas simulações de economistas sugerem que mais de 13,5 milhões de contribuintes seriam prejudicados. Além disso, haveria perda de arrecadação de R$ 7,6 bilhões.

“Com a taxa única de Imposto de Renda proposta pelo candidato Jair Messias Bolsonaro (PSL), a alíquota de quem ganha até R$ 2,8 mil saltaria de 7,5% para 20%. Enquanto isso, quem ganha acima de R$ 4,6 mil teria redução de 7,5 pontos percentuais na taxa. Essa redução na taxa inclui as altas rendas, como quem ganha R$ 135 mil por mês. Você acha isso justo?”, questiona o movimento Reforma Tributária Solidária, em sua página no Facebook.

Segundo Grazielle, é importante que exista maior alinhamento e equidade entre pessoa física e jurídica, até para evitar distorções como o fenômeno da pejotização. “Mas isso não pode ser feito tendo uma alíquota única no IR de pessoa física, anulando o papel desse tributo na redução das desigualdades”, aponta.

Ela destaca que quem defende o papel da política fiscal na redução da desigualdade não é só a esquerda, como tentam fazer parecer algumas candidaturas, mas também instituições ortodoxas. “Entidades como FMI têm defendido que a política fiscal, tanto na tributação quanto no gasto social, promova redução de desigualdade. Para isso, deve ter diferentes alíquotas para a pessoa física, de maneira que se garanta a capacidade contributiva e a progressividade”, defende.

Em um país como o Brasil, a ideia do liberal Paulo Guedes – inspirada no economista Milton Friedman – deve aumentar ainda mais o fosso que separa pobres e ricos. "O projeto do Paulo Guedes é o do (presidente Michel) Temer ao quadrado. Fundamentalista e neoliberal. Teria ou terá um efeito catastrófico em uma sociedade desigual como a nossa. Vamos tender para o apartheid social. É insustentável", aponta o professor de Economia da Unicamp, Padro Rossi, em entrevista à Carta Capital.