“Momento é de regressão civilizatória”, diz advogado criminalista

Para o advogado criminalista Alamiro Velludo Salvador Netto, professor de Direito da USP, a prisão do ex-presidente Lula, determinada pelo juiz Sérgio Moro nesta quinta (5), é produto de uma interpretação judicial “insustentável”. Na sua opinião, a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) contra o habeas corpus ao petista, permitindo sua prisão após condenação em segunda instância, marca “um momento muito triste da história política e judiciária do país”.

Alamiro Velludo Salvador Netto

“A gente vive um retrocesso civilizatório. Em nome de conceitos vagos, como um sentimento social de Justiça, um clamor popular, enfim, em torno dessas ideias que me parecem muito mais retóricas, a gente vive um momento de regressão civilazatória”, defendeu.

Ao comentar a ordem de prisão emitida por Moro, Velludo avaliou que não houve surpresa no encaminhamento. “Houve o esgotamento da instância ordinária, do TRF da 4ª Região, em face do que foi decidido ontem pelo Supremo, e da consequente queda da liminar que impedia a prisão. Então agora o que se tem é só a operacionalização do ato, uma dinâmica burocrática do Judiciário. (…) A impressão que fica é que o ofício encaminhado a Moro já estava no gatilho para ser disparado”, disse ao Portal Vermelho.

De acordo com ele, “o grande problema de tudo isso que está acontecendo foi a forma como o Supremo interpretou o conceito de presunção de inocência e trânsito em julgado. Isso é que, infelizmente, marca um momento triste da história política e judiciária brasileira”, lamentou.

Na sua opinião, o dispositivo constitucional brasileiro não dá margem a outra interpretação que não a de que só é possível iniciar a execução da pena quando terminado o processo. “A Constituição utiliza expressamente um termo, que é um conceito jurídico, de transito em julgado, que significa no momento em que, sob uma decisão, não cabe mais nenhum tipo de recurso. Foi a escolha feita pelo Constituinte em 1988 e que foi ratificada pelo Congresso em 2011, quando se alterou o Código de Processo Penal, reproduzindo esse comando constitucional”, disse, em discordância com o entendimento do STF.

Ativismo judicial

Para ele, o que aconteceu na sessão do Supremo, nesta quarta, “foi uma demonstração de um ativismo judicial”, no qual a corte interpretou a norma “para muito além daquilo que ela permite”. Segundo ele, caso haja o entendimento de que seria razoável as prisões acontecerem no país depois do esgotamento dos recursos em segunda instância, isso devia ser objeto de debate no Congresso, para alterar a legislação, mas não é um papel que cabe ao Judiciário.

“A prisão [de Lula] é produto dessa interpretação judicial que, ao meu ver, é insustentável. E esse é um debate que vai além do próprio ex-presidente. Lula é um cidadão brasileiro como qualquer outro e tem o direito de ter as garantias constitucionais que nossa Constituição estabeleceu. A decisão do Supremo frustra essas garantias não só em relação a ele, mas em relação a toda a população que se vê vulnerabilizada”, declarou.