Deputado ataca Universidade da Integração e propõe aniquilar o projeto

A Universidade Federal da Integração Latino-Americana (Unila) foi criada em 2010 na região da tríplice fronteira – Brasil, Argetina e Paraguai – em Foz do Iguaçu, no Paraná. De lá pra cá esta proposta inovadora alterou a paisagem e a convivência das mais de 70 etnias que já viviam na cidade. Um projeto do deputado Sérgio Souza (PMDB-PR) propõe, não só aniquilar a Unila, como também, uma parte da Universidade Federal do Paraná, a mais antiga universidade do país.

Por Mariana Serafini

Unila - Fachada - Divulgação / Unila

A Unila foi inovadora em sua criação por ser vocacionada para a integração dos povos latino-americanos. Um polo de integração do saber e do conhecimento com objetivo de unir e desenvolver o continente. Desde o início, tem um perfil diferente de outras federais. Talvez a principal marca seja os diferentes rostos. Ao entrar num campus da Unila é possível encontrar alunos de todas as partes do Brasil – com sua riqueza de culturas e sotaques – e ao mesmo tempo, estudantes de outros 18 países da América Latina e Caribe.

A ideia inicial sempre foi fomentar o conhecimento, atrair estudantes de todo o continente, para que eles voltem aos seus países e contribuam com suas comunidades locais. Este processo aproximou famílias, possibilitou sonhos e significou um passo importantíssimo rumo à consolidação da Pátria Grande, um continente soberano.

Mas tudo isso está ameaçado com a Emenda Aditiva proposta pelo deputado Sérgio Souza que prevê, entre outras medidas, o fim da Unila e a incorporação de dois campi da UFPR à uma nova instituição denominada Universidade Federal do Oeste do Paraná. Vale ressaltar que já existe a Universidade Estadual do Oeste do Paraná (Unioeste) e ao propor esta terceira instituição o parlamentar aniquila dois projetos distintos para criar uma alternativa que não acrescenta ao campo do conhecimento.

O argumento do parlamentar é de que os estudantes da atual Unila seriam “integrados” a esta nova universidade. Mas não foi com este objetivo que muitos deles deixaram para trás a família, os amigos e se aventuraram em um novo país em busca de um curso superior. Esta nova universidade não propõe uma grade curricular voltada para a integração dos povos, não é um projeto ousado como foi a Unila, pelo contrário, atende a interesses específicos de um setor empresarial da região.


Campus da Unila em Foz do Iguaçu | Foto: Divulgação / Unila
 

A ex-presidenta Dilma Rousseff se pronunciou em defesa da Unila, dos professores, funcionários e estudantes da instituição. “Eu tenho grande orgulho da Unila porque temos compromisso com a integração latino-americana e sou radicalmente contra a emenda do deputado Sergio Souza que pretende transformar a Unila em outro projeto. A Unila foi vocacionada para a integração latino-americana em nós não podemos aceitar esse tipo de mutilação nesse processo tão importante como é a integração. A Unila vai resistir!”, disse.

Para a estudante uruguaia Besna Yacovenco, que depois de concluir o curso de Ciências Políticas e Sociologia da Unila iniciou o mestrado em Integração Contemporânea da América Latina na mesma universidade, trata-se de um ataque preocupante que fere as duas instituições e diz respeito a um processo mais amplo, que envolve toda a realidade do Brasil pós-golpe.

“Ele [o deputado Sérgio Souza] propõe criar uma universidade para atender um setor especifico da sociedade: só os empresários. Porque a ideia é ter uma universidade vinculada diretamente com o agronegócio. Isso afeta totalmente os interesses, o projeto e os alunos que estão aqui [na Unila], os professores, os técnicos e toda a sociedade iguaçuense que abraçou este projeto e se desenvolveu junto”.

Ao propor esta terceira instituição, todo o projeto de integração pensado e desenvolvido por grandes intelectuais dos mais diversos países latino-americanos é completamente destruído. Os alunos que atualmente já estudam na Unila voltariam para seus países sem ter atingido o objetivo que os trouxe ao Brasil; os brasileiros também não seriam contemplados com o curso que escolheram e novos alunos estrangeiros não teriam nenhum interesse em vir estudar em uma universidade que não oferece esta possibilidade tão rica de troca de conhecimentos regionais.


Uma das principais características da Unila é diversidade de povos e culturas | Foto: Divulgação / Unila
 

A ameaça às duas universidades mobilizou a comunidade acadêmica e, em nota, o reitor da Unila, Gustavo Vieira, e o diretor do Campus Palotina da UFPR, Elisandro Frigo, se pronunciaram e deixam claro que não são contrários à criação de uma universidade nova universidade na região. “No entanto, uma nova proposta não passa pela destruição de projetos que já estão consolidados nos territórios, sem respaldo político, jurídico e cultural da sociedade, que é diretamente atendida por tais projetos”.

Besna, que está há seis anos no Brasil, lamenta profundamente o desmonte destes dois projetos. “Eu vim estudar numa universidade que tem um projeto de Estado para pensar e criar tecnologias e conhecimentos que promovam a integração solidária dos povos da América Latina e o Caribe. Essa é a universidade que me faz ficar por seis anos longe do meu país. A proposta do deputado vem contra tudo isso. Ele quer criar uma nova universidade, destruindo outras, e não é para atender à criação de ciência e conhecimento para a sociedade”, denuncia.

Em nota, a Unila ressalta que a emenda do parlamentar atenta contra um projeto do Estado brasileiro respaldado pela comunidade acadêmica e por importantes instituições da integração regional, entre elas o Parlasul (Parlamento do Mercosul), que atualmente é uma das principais referências na defesa do projeto.

O documento emitido pela universidade alerta ainda para o fato de que o parlamentar Sérgio Sousa “não tem respaldo político das instituições implicadas, nem jurídico, uma vez que a Emenda não cumpre o devido processo legislativo. Nesse sentido, a Reitoria seguirá acionando os diversos canais administrativos, jurídicos e políticos, com o intuito de defender o projeto original de criação da Unila”.

O ataque do peemedebista é mais uma face do golpe contra o projeto de um continente forte, soberano e voltado para a construção de uma sociedade mais justa e solidária para os povos latino-americanos e caribenhos.